Filhos são sempre surpreendentes.
Os anjos que Deus nos dá para nos fazer
seres humanos melhores, por vezes nos surpreendem, mesmo quando achamos que
tudo sabemos sobre eles, afinal os consideramos nossas crias, nossas criaturas,
bem por isso acreditamos que os conhecemos como "a palma de nossas
mãos". Entretanto, esquecemos que eles são seres cuja trajetória foi
traçada por Deus e vivenciada por eles, a cada instante, e, para isso, eles não
necessitam de nossa "aprovação". Eles apenas vivem e a nós, mães, restam-nos
apenas o papel de expectadoras de suas vivências.
Há alguns dias
me surpreendi com Rafinha, exercendo seu poder de argumentação, à mesa do café
da manhã, para convencer a mim e ao pai dele a deixá-lo adotar um gatinho,
filhote ainda, cujo nome ele já nos foi solicitando ajuda para escolhermos com
ele. Dinho ou Dinha, dependerá do filhote, cuja escolha ele já fez na ninhada
do vizinho, entretanto ainda não soube identificar o sexo do bichano.
Diante do
exposto, só nos restou "impor algumas condições" e aceitar a
experiência felina. A partir daí, ele já começou a pensar na casinha, nas
obrigações, nos brinquedos e tudo o que a sua imaginação infantil conseguiu
arquitetar.
Fato consumado.
Em estado de espera, comunicamos a Gui sobre o novo habitante que em breve
chegará. Novas ponderações, novos argumentos.
Todos à espera do grande dia!
Eis que hoje
surge um gatinho abandonado na ruazinha atrás da nossa casa. Vi-o, quando
estava saindo, com os seus olhinhos enormes e tristes a me olhar. Voltei.
Busquei um pedaço de peixe e o servi. Aparece o vizinho e me mostra que já
havia dado leite a ele. Saí com a consciência "franciscana" de ter
feito uma boa ação.
Algumas horas
depois, recebo uma ligação de Gui, falando-me sobre este filhote de gato que
ele também havia visto, e lá vamos nós para mais uma rodada de argumentos e
ponderações. Cujo argumento mor é: se vamos adotar um gatinho, por que não um
que já está abandonado? Ou por que não podemos ter os dois? Entretanto, esta
argumentação é insuficiente, esclareço para ele que conviver com um felino já
será para mim um sacrifício, imagine com dois.
Ao voltar para
casa, surpreendo-me ao me deparar com as sobras de quatro banquetes servidos para
o gatinho, sinal que outros vizinhos também haviam se sensibilizado com o seu
olhar abandonado; sonolento agora, após farta comilança. E cujo veto meu a sua
adoção, rendeu-me um olhar pensativo e triste do meu Gui. E um belíssimo texto,
feito por ele, motivado pelas suas dores: da percepção do abandono felino e da
impossibilidade da sua adoção. O qual, em minha corujisse transcrevo-o:
Gatinha
Acaso Gatinha,
Cometeste algum pecado?
Mal chegaste a esse mundo,
(E és recebida com)
O apertado abraço da fome,
E o frívolo beijo da solidão...
Gatinha amiga minha,
Tens ideia de quão grande é o mundo??
(150 milhões de quilômetros)
E o "bicho homem" domina essa terra tão vasta,
São mais de 7 bilhões da espécie dos "serumanos".
Mas gatinha não tema,
Achas que isso importa algo para mim?
Pois nenhum desses "senhores da terra",
Tem um olhar tão belo!
(Mesmo carregando tanta tristeza e angústia)
Quanto o seu...
(Guilherme Alves)